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29 de setembro de 2006

Mistérios


Não tem a ver com a minha especialidade, mas quando se lê revisões como a do recente número da revista Lancet (uma das mais prestigiosas da área médica) de 2006 sobre a síndrome da fadiga crônica tem-se a impressão de se estar voltando no tempo (coisa pouca, uns cento e cinqüenta anos).
Primeiro porque há ainda controvérsias sobre se a doença realmente existe (daí já dá para se ter noção da barafunda).
Segundo, porque dentre as possíveis causas são enumeradas praticamente todas as causas de praticamente todas as doenças existentes (a lista vai de infecção por vírus até problemas imunológicos, psiquiátricos, endocrinológicos, etc.).
Terceiro, porque além da própria fadiga, o que mais há de sintomas próprios da doença? Bem, nada mais, a não ser... uma enorme fadiga!
Um ponto interessante (não sei se é por que sou um entusiasta assumido deste tipo de tratamento ainda “engatinhando” no Brasil, infelizmente) é o fato de que o único tratamento realmente eficiente para o problema é a terapia cognitiva-comportamental (que, aliás, é muito boa para ajudar a resolver muitos dos problemas “misteriosos”, ou então os multifatoriais, ou seja, aqueles que possuem mais de uma causa).

26 de setembro de 2006

Goiabadicto



Uma crença muito difundida é de que uma vez que se recorra ao uso dos broncodilatadores (Berotec, Aerolin, Bricanyl, etc.), seja na forma de nebulização ou do spray (as “bombinhas”), o paciente será sempre um dependente deles, será um viciado no seu uso.
Nada mais errado.
Imagine um sujeito que nunca tenha comido goiaba e que no dia em que visita a chácara de um amigo, experimente a fruta e a partir dali nunca mais deixe de ter goiabas na fruteira de casa.
Com os broncodilatadores ocorre a mesma coisa. O fato de vermos uma ou outra pessoa usando broncodilatadores com alguma freqüência (freqüência grande em alguns casos), significa que esta pessoa se beneficia de seu efeito (assim como quem se delicia com o gosto da goiaba quer tê-la sempre por perto).
Não há nenhum vício (ou dependência) implicado. Nem na goiaba (há apenas um benefício: eliminação do “desejo de comer goiabas”), nem nos broncodilatadores (benefício: melhora da falta de ar ou dos outros sintomas relacionados, como a tosse).
Quer parar, achou outra fruta mais apetitosa, achou outra medicação mais apropriada para seu caso, passou mal de tanto comer goiabas, apresentou alguma reação adversa com os broncodilatadores, adeus goiaba, adeus broncodilatador.
Simples assim.

22 de setembro de 2006

Abra a KBça *


De um lado, moças ou meninas-moças com seus desejos, inseguranças, temores, ansiedades.
De outro, rapazes, com mesmos sentimentos (apenas que mais ocultos), no entanto “loucos” para se aproveitarem das facilidades para sua iniciação sexual.
E no centro da questão, especialistas em comportamento e sexualidade decretando: chega de “nhenhenhem!” (A partir de agora, é ação!)
É a propaganda instrutiva do guaraná Kuat, que sempre nos seus comerciais carrega na temática sexual, mesmo que de forma “sutil”.
Fala direto para seu público alvo (quem toma guaraná normalmente, senão pré-adolescentes e adolescentes?). E usa a tática do “vamos ser bonzinhos com essa turma, é o que eles querem ouvir, não é mesmo?”
Então, para que vamos perder tempo com relacionamentos mais aprofundados, respeito às necessidades e desejos do outro, valores mais nobres, “nhenhenhem”, enfim?
E o que é mais preocupante: campanhas sérias (não necessariamente “caretas”) que falem à sexualidade dos adolescentes, onde estão? No máximo, o que vemos são trabalhos como o da VJ Penélope da MTV, PhD em... deixa pra lá!
*Por enquanto, o lema é “abra a cabeça!”, mas será que vamos nos assustar quando o lema for “abra outras coisas”?

19 de setembro de 2006

Do Intestino para os Rins


Infecções intestinais (gastroenterites) causadas por um tipo específico de germe (Escherichia coli O157:H7, presente em carnes mal cozidas*, leites e alguns sucos não pasteurizados, normalmente) podem causar a síndrome hemolítica-urêmica, uma falência (normalmente temporária, mas potencialmente grave e permanente) dos rins, provocada pela destruição de células vermelhas e plaquetas (células responsáveis pela coagulação), causada pela ação da toxina do germe.
Apesar de relativamente infreqüente, sua incidência tem aumentado.
O principal recado para a prevenção do problema é:
Evite comer carne de gado mal cozida (hambúrgueres, principalmente) e leite não pasteurizado (no caso de leite “de leiteiro”, deve ser sempre fervido) e cuidado com a prescrição de antibióticos no caso de diarréias, pois há consenso de que seu uso aumenta a chance da doença aparecer.
* Uma “epidemia famosa” - de âmbito mundial - do germe ocorreu no McDonald’s alguns anos atrás.

15 de setembro de 2006

Na Raiz


Perdoem-me pela péssima comparação.
Mas, em entrevista recente no “Sem Fronteiras” do canal Globonews, uma cientista política de Harvard propôs a solução para o combate ao terrorismo: crie-se um factóide qualquer e anuncie que a guerra está ganha. A partir daí, não dêem mais bola para eles.
O método didático da ignorância (no bom sentido).
O mesmo método que tentamos aconselhar às mães na lida com seus pequenos “terroristas” domésticos nas suas “crises de birra”.
Funcionará?
Quando bem aplicado, não há alternativa.
Saiu de onde a idéia?
Por coincidência, de uma mulher.
Quase sem testosterona. E, provavelmente, mãe.

12 de setembro de 2006

Ah é, é?


Vim para confundir, não para explicar.
Assim parece ser com o estudo divulgado na edição de abril deste ano no Pediatrics a respeito do papel dos alérgenos (todo agente capaz de produzir alergia) domésticos em crianças asmáticas.
Diz lá mais ou menos o seguinte:
Não importa o quanto as crianças alérgicas (asmáticas, neste caso) se exponham dentro de casa a alérgenos como fumaça de cigarro, restos de cocô de barata e mofo, sua incidência de crises de asma vai ser igual à daquelas que vivem em ambientes totalmente “clean”.
Isto não deveria soar como novidade, no entanto, visto que as crises asmáticas têm nos alérgenos apenas um (importante, é verdade) fator, dentre muitos (como uso correto de medicações, perfil psicológico do paciente, nível de atividade física, exposição a fatores não-alergênicos como o ar frio, alimentos e os próprios medicamentos, etc.).

8 de setembro de 2006

Cidade


Observo da janela do meu apartamento uma cidade inteira desenhada com giz colorido no cimento cru da entrada da garagem da casa ao lado. Projeto da autoria de três ou quatro meninas da faixa dos 7 a 8 anos, creio.
Há na cidade:
Três (isso mesmo, três!) pet-shops. Um para cada uma das meninas, ao que parece, pois cada um tem um nome feminino na placa desenhada.
Várias vagas de estacionamento (onde se lê vários: “reservado”).
Um intrincado sistema viário.
Três casas, sendo que apenas uma mansão (no centro da qual está uma enorme cama, próximo a um sofá – sei que é um sofá, pois está escrito que é um).
Bosques recheados com árvores por todos os lados. Talvez haja um mar por ali, visto que há ondas em giz azul.
E, me parece que seja o item principal, um parquinho, bem na entrada da cidade onde está escrito: Bem Vindo (sem hífen, pra que serve um hífen, afinal de contas?).
É isso: são todos, a princípio, bem-vindos ali.
Fiquei, então, imaginando onde faria compras. Poderia passar algum tempo a base de ração. E se ficasse doente? Claro, remédios, agulhas e seringas não devem faltar num pet-shop. Cabeleireiro, também (vejo muito poodles com cortes im-pe-cá-veis).
Um projeto acabado de urbanismo. Ao custo módico de algumas barras de giz. Uma cidade tão perfeita quanto efêmera. Ruirá à primeira chuva mais forte. Ou com as marcas de pneus.
Ou, ainda mais tragicamente, com a perda da inocência das arquitetas.

5 de setembro de 2006

Tudo Conservantes no Quartel d'Abrantes


Neste bimestre uma revista regional de pediatria (Pediatria A Dia) apresenta uma entrevista com o alergologista brasiliense Wellington G. Borges sobre os aditivos alimentares.
Ensina-nos ele:
Por ano, um homem adulto consome em torno de 70 kg (outro homem, então) em aditivos alimentares (preservativos, emulsificantes, estabilizantes, acidulantes, corantes e outros “antes”)!
A FDA (Foods and Drugs Administration, nem sempre uma salvaguarda da nossa saúde, mas a melhor que temos) tem mais de 3000 aditivos alimentares aprovados para uso e outros 20.000 que são classificados como “geralmente seguros”.
Os aditivos, ao contrário do que se acredita, são realmente seguros para o consumo, apresentando incidência muito pequena de reações adversas no organismo humano.
Nos medicamentos é que a coisa pega: diferente dos alimentos, os aditivos são os componentes principais (embora ainda assim possam ser considerados seguros na maioria das vezes).
As reações aos aditivos podem ser de várias naturezas: alérgicas, farmacológicas, químicas, psicológicas e imunológicas (todas relativamente pouco freqüentes).
E, por último: não há qualquer fundamento científico em se tentar retirar corantes da dieta de crianças que tenham apresentado algum episódio de urticária aguda (urticárias podem ter várias causas, muitas difíceis de se comprovar; além disto, estas dietas vão criar muitas dificuldades e estigmas para a criança).

1 de setembro de 2006

Desbocado


É verdade o que diz o ditado alemão: “aftasardem, hemorroidasidem”.
As estomatites (“inflamações da boca”) aftosas, então, são doenças que, apesar de benignas, incomodam muito. Curam espontaneamente em torno de 10 a 14 dias, mas até lá, dificultam a alimentação da criança e causam sofrimento (é um dos problemas que mais fazem pais voltarem para que o médico “ache alguma solução”).
Já as estomatites herpéticas (primeira infecção pelo vírus do herpes – labial, normalmente) podem se parecer com as estomatites aftosas. Têm como grande diferença clínica a inflamação das gengivas, que podem ficar sangrantes. Após tempo variável (que pode ser de anos) vão causar o herpes labial. Também costumam curar sozinhas (e incomodar muito).