Procure por assunto (ex.: vacinas, febre, etc.) no ícone da "lupinha" no canto superior esquerdo

29 de novembro de 2013

Atitude de Mosca


Em círculos concêntricos, a mosca passeia ao redor da cabeça do sapo, sentado na vitória-régia. 
Inicialmente preocupada, atenta à qualquer possibilidade de movimento, mas principalmente no olhar do bichano-anfíbio. Que faz que não é com ele, pacientemente estático, como um sapo de louça, enfeite de jardim. 
E vai a mosca se aproximando da órbita, testando, tateando, se distraindo, sorridente até - sorriso de mosca, desdentado, desbocado, até que...
"Vlupt"! Mais uma na goela do monstro verde, que imita ele agora um sorriso, esperteza e satisfação.
Uma das causas mais comuns de acidentes na criança pequena é essa inocente atitude de mosca por parte dos pais que, quando chegam ao atendimento médico de urgência costumam explicar:
"Mas ele nunca tinha feito isso antes!".
Como se para fazer alguma besteira a criança tivesse antes que treinar!
O erro - que pode ser fatal - é duplo: "porque nunca fez não vai fazer" ou achar que - mesmo nos muito pequenos e totalmente irresponsáveis - a responsabilidade chegou cedo, e "já provou que conhece os perigos".

26 de novembro de 2013

O Certo Pelo Errado


Dia desses a mãe de uma criança comentou, desanimada:
"Cuido tanto para que o meu filho (de menos de 1 ano) coma tudo certinho. Não dou doce, não salgo a comida. Comida industrializada, não deixo nem chegar perto. O problema é que quando estou na frente dos outros (principalmente de outras mães) fico me sentindo mal, porque parece que eu é que estou errada, e as mães que vivem dando bobagens estão certas..."
É assim. Até porque quem faz o errado pode ter a consciência pesada e desejar levar os outros "para o mal caminho".
Pega o exemplo do jovem que, incluído num grupo de bebedores habituais, deseja se manter abstêmio. Vira ele o errado, mesmo que no íntimo todos saibam que ele é o certo - pelo menos nos efeitos da bebida no longo prazo.
Assim com os fumantes. Ou usuários de ecstasy. Ou...
O que importa são as convicções de cada um. E a força de permanecer diferente, "forte" ou mesmo "careta", "bizarro", mas em paz com suas convicções.
Da nossa parte, enquanto médicos, temos que dar força para comportamentos adequados, claro (ainda que as posturas acusatórias e os sermões não sirvam pra nada ou até piorem os comportamentos).

22 de novembro de 2013

Expertise de Balcão


Se você vai de vez em quando à farmácia, sabe (ou, pelo menos, desconfia).
Se você já trabalhou ou trabalha como balconista, tem certeza.
Muitos dos produtos "top de venda" dão bônus (polpudos bônus, às vezes) para quem os vende. Principalmente se os produtos em questão não valem nada, que é quando há necessidade de um estímulo para que saiam das prateleiras para seu saquinho plástico.
No quesito "mães-ansiosas-com-seus-filhos-doentes" (ou "que-não-comem-direito"), os balconistas (devidamente trajados com aventais brancos, pois para endossar roupa branca não se necessita de diploma universitário) deitam e rolam com recomendações para estimular o apetite, melhorar a imunidade, evitar ou curar gripes, etc.
Chegamos ao ponto em que uma consulta pediátrica por convênio em algumas cidades está valendo menos que um "leva esse, que esse é bão" bonificado!


Eu, fosse médico cubano, pediria emprego é numa farmácia... 

19 de novembro de 2013

Quase Tudo


Eu acho às vezes que o minimizar informação é "a jogada" nos dias que correm.
Porque se tem muito. E quando se tem muito é difícil irmos longe em cada uma delas.
Vou dar o exemplo da dieta e do engordar:

Carboidrato é ótimo. Ótimo de gosto e ótimo numa dieta equilibrada.
Ocorre que facilmente desequilibramos com carboidratos.
E carboidrato sobrou, o organismo estoca ("burramente", pode-se dizer).
Estoca de que forma? Transformando em gordura (ninguém que come muito pega nas pregas do abdome e diz: "Olha meus carboidratinhos!" - mas foram eles, os carboidratos, que criaram as "gordurinhas", normalmente!).
E o que são, afinal, os carboidratos?
O que não é carne, leite e ovos (proteínas) e o que não é gordura!
É, então, quase tudo: pão, biscoito, arroz, macarrão, fruta, legume, bolo, refrigerante, suco...

(E aí, foi demais?)

15 de novembro de 2013

Check-List da Saúde


O mundo é dos que...
Acordam cedo, mas dormem bem
Não comem demais - e comem com qualidade
Se exercitam (mas não demais)
Se utilizam do banheiro com o ritmo dos calendários
Quase não bebem
Não fumam nada
Jogam? Só bola...
Fazem sexo com regularidade, de preferência com um(a) só parceiro(a)
Quase não usam medicamento
Se relacionam socialmente
São informados
Até têm sentimentos negativos, mas não os nutrem
Rezam. Ou, pelo menos, têm esperança
Dirigem com prudência, carros e negócios
Ganham o suficiente, pelo menos mais do que gastam
Correm poucos riscos, mas correm alguns
Passeiam, viajam
Não brigam
Não cospem (nem no chão, nem nos outros, nem no prato que comeram)
Não são radicais, nem de opinião frouxa
Choram um pouco, mas sobretudo
Dão muitas risadas


Conheci, entretanto, um ou dois que morreram cedo cumprindo rigorosamente a lista acima (um deles no próprio ato da checagem!)


Conheci, além disso, três ou quatro que viveram centenários zerando essa ridícula lista...

12 de novembro de 2013

Coisa de Pobre



Serve pouco e não deve levar nenhum grande crédito a observação pessoal de um único pediatra (o que vos escreve), mas...
... tenho falado para os pais que (na nossa região, em situações normais de atendimento, em consultório - não em emergências - mas pode muito bem ser que também em emergências) há cerca de seis anos quase que paramos de nos preocupar com diarréias nas crianças pequenas!
E o que houve de diferente (mesmo!) nestes últimos anos?
A vacina do rotavírus.
Outros vírus ainda têm causado diarréia, principalmente em creches e escolas. Mas geralmente com evolução muito, mas muito mais benigna do que se via há apenas uma década!
A tal ponto que se ver criança desidratada virou raridade (sempre lembrando: escrevo por essas privilegiadas bandas)! O mesmo vale para o despropósito (agora) de se usar soro de reidratação oral para simplesmente "cocôs moles" (até porque pode, em alguns casos, piorar o "cocô mole").
Os outros méritos (aleitamento, saneamento, maior vigilância, pastorais, disponibilidade dos sais de reidratação) permanecem, e eu desconfio (de novo, apenas desconfio) que nossa pujança econômica coincidente da mesma época também deva ter uma grande importância (pois, se sabe, criança pequena morrer de diarréia "é coisa de pobre"... - país pobre!).

(De novo nesta postagem usei a figura do personagem Starvin' Marvin, totalmente politicamente incorreto, motivo pelo qual deixei de assistir ao South Park...)

8 de novembro de 2013

To Ruin Or Not To Ruin?...


Eu "cai" acidentalmente num texto de 2010 para o New York Times do psicólogo de Harvard Steven Pinker sobre essa nossa (minha?) preocupação sobre se o excesso de exposição à mídias (smartphones, twitters, googles, etc.) vai de algum modo nos prejudicar, ou prejudicar a mente dos mais novos, mais aficcionados do que nós a esses gadgets todos, reais ou virtuais.
Sua resposta "desinteressada" (pois um acadêmico sem ações do Google, até onde eu saiba) é "não", podemos ficar tranquilos.
Nosso cérebro, escreve, não é tão moldável quanto às vezes nos fazem acreditar. Obter informações diretas e digeridas de um Power Point não vai nos fazer pensar "powerpointicamente" (minha expressão), bem como acessar o Google não nos impede de sermos profundos quando desejamos.
Nossas experiências cerebrais e sensoriais costumam ser específicas ("Ninguém se torna melhor matemático estudando música") Não? Mas algumas vezes nos ensinaram isso! ("Bem como resolver jogos brain-training não te faz mais esperto"). Não? Ó!... Joguemos fora todas aquelas palavras cruzadas! Aprender essas coisas te faz melhor apenas e tão somente nessas coisas e não em todo o resto que envolva a atividade cerebral.
Inversamente, desaprender a escrever nas infinitas mensagens, postagens (epa!) e tweets não nos torna inevitavelmente burros ou analfabetos (exceto se já estamos fazendo enorme esforço independente para sermos - grosseira observação minha, claro).
Excesso de informações e estímulos (escreve Pinker) podem nos distrair das nossas atividades principais e até serem aditivos, principalmente em pessoas com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. Como qualquer outra tentação, Pinker sugere que se coloque um limite para o uso dessas coisas, como desligar aparelhos às refeições ou próximo da hora de se deitar, por exemplo.
"O conhecimento e as informações", conclui, "crescem de maneira exponencial. A capacidade cerebral e o número de horas que se pode ficar acordado, não. Por isso devemos abençoar o aparecimento de mecanismos de busca e estocagem de informação, e não demonizá-los. O que vale é o uso correto, o desenvolvimento de senso crítico, a capacidade de análise. Isso tudo tem lugar para se aprender: as universidades. Usar as novas tecnologias não nos fará mais estúpidos, senão mais espertos".

(P.S.: Desnecessário dizer que muita gente "caiu de pau" nessas opiniões. Para se ter uma idéia, basta dar uma olhada no site Edge)

5 de novembro de 2013

Atravessada


Dia desses vi uma jovem senhora, mãe de dois filhinhos muito bonitos, atravessar a rua quase na frente do meu carro com um ar de preocupada (escola? banho? dificuldades econômicas?) e me pus a pensar:
Será que ela sabe que essa é a hora? Que isso que ela está vivenciando agora não é, na realidade, preparação pra nada? 
Claro que não. Quase nunca sabemos. Estamos sempre nos preparando para algo, mais ou menos afobados, afogados.
Esse momento congelado na minha memória, neste texto, ficou congelado pra mim, não pra ela. Sou eu o espectador. Eu é que consigo me afastar, analisar, refletir, tirar lição. Lição pra ela. Lição de mim pra mim deixe que outros tirem, que eu sou incapaz. 
Tão incapaz quanto essa jovem e felizarda senhora que perde tempo com suas angústias maternas, com esse cenho franzido, atravessando a rua com cara de que algo sério ou grave pode estar para acontecer. 
Sério, grave, trágico é que esse momento tão belo (inocentes filhinhos fielmente agarrados à sua protetora mãe) é descaradamente finito.
E não está sendo suficientemente percebido.
(Ou eu vejo demais?)

1 de novembro de 2013

Prefiro Uma Vida Sem Remédios


Claro. É uma afirmação aparentemente óbvia.
Aparentemente.
Quem vai querer usar remédio, se  pode abrir mão dele?
Aparentemente ninguém quer ficar doente. E aqui, de novo, aparentemente. Há muitos ganhos em adoecer. Maior atenção por parte dos familiares (nem sempre), abstenção da escola ou trabalho, "mordomias"...
Na minha área, a Pediatria, é possível (desejável) ter uma política "anti-medicamento", principalmente com a evolução em outras áreas (vacinas, saneamento, nível educacional e acesso à informação, acesso a psicólogo, controle laboratorial, etc). Até com a função educativa: a "muleta" do remédio é usada como substituto frequente de uma vida mais "completa" para muitas pessoas (interação social, resolução de conflitos, prática de esportes, acesso a cultura, etc.).
O perigo é o fanatismo. Alguns pacientes (pais) têm encarado o medicar como tragédia, causando alguns sofrimentos desnecessários para eles ou para seus filhos.
Não tiro a razão da desconfiança. Vivemos numa época em que uma certa paranóia é desejável (basta perceber o número de trabalhos científicos e a quantidade de médicos patrocinados por indústrias farmacêuticas). Mas a internet propicia a "conferência". Será que é isso mesmo? Preciso tomar "essa meleca"? Há alternativas? Quais são os riscos? Conheço alguns pacientes melhor informados do que os médicos a respeito dos seus remédios - ou até da sua doença.
Então não sejamos (pacientes e remédios) inimigos. Nem amigos "de se pôr a mão no fogo"! Amigos "com um pé atrás" parece a melhor postura.